Escrevo este post
para tentar esclarecer um pouco mais sobre um assunto muito polêmico que é o “desconto
salarial de funcionários em greve”, em especial em relação à greve de
professores que tem contornos diferenciados.
Digo que é um tema polêmico porque há argumentos para ambos
os lados, sejam para os que defendem a possibilidade (legalidade) do desconto, sejam
aqueles que dizem que é ilegal tal prática.
Essas duas correntes de pensamento incidem tanto na greve da
iniciativa privada como na do setor público, uma vez que a base legal
utilizada é a mesma, a Lei 7.783/89 (lei
de greve) e a Lei 9.394/96 (LDB).
Importante frisar que o Supremo Tribunal Federal-STF já
decidiu que a Lei 7.783/89, que trata da greve no setor privado, também se
aplica à greve no setor público, haja vista que este último carece de
instrumento normativo próprio.
Passando, então, à análise da Lei 7.783/89, em especial o
artigo 7º, percebemos que a norma diz que durante o período de greve, o
contrato de trabalho fica suspenso.
Inúmeros juristas ao tratarem da interpretação do referido
texto legal, entendem que não há obrigação do empregador em pagar os salários
dos funcionários em greve, pois a norma diz que o contrato de trabalho
fica suspenso enquanto perdurar o movimento. No mesmo sentido, ainda
complementam dizendo que o salário corresponde a uma contraprestação, desta
forma como não há a prestação equivalente (o trabalho) não há a incidência
salarial. No direito alemão tem-se a expressão “Kein Arbeit, Kein Lohn” (“sem trabalho, sem
remuneração”).
Essa interpretação dada pelos juristas é também acompanhada
pelo Tribunal Superior do Trabalho-TST na grande maioria de suas decisões.
Na mesma toada, o nosso Supremo Tribunal Federal-STF
assim decidiu: “os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos,
salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no
pagamento aos servidores públicos civis, ou por outras situações excepcionais
que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho” (RE 456.530/SC, j. 13/05/2010, Rel. Min. Joaquim Barbosa).
Já em sentido contrário, há aqueles de defendem que é ilegal
o desconto salarial dos dias parados dos trabalhadores em greve.
Um dos principais argumentos é que tal desconto esvazia todo
o sentido do direito constitucional à greve, haja vista que seria uma forma
coercitiva de frustrar o movimento, prejudicando aqueles que reivindicam um
direito, principalmente quando a greve é julgada legal.
No entanto, apesar dos dois posicionamentos acima referidos,
no caso da greve de professores, o desdobramento dessa legalidade ou ilegalidade
do desconto salarial ganha outros contornos. Isso porque essa atividade
(ensino) tem a Lei 9.394/96 (LDB) que traz algumas peculiaridades.
A LDB institui que o ano letivo deve ter 200 dias letivos, o
que garante ao aluno esse direito subjetivo de prestação da atividade
educacional sem redução. E é justamente essa disposição legal da LDB que pode
garantir ao profissional docente o direito de receber salário pelos dias
parados.
Isso se se explica porque mesmo que o professor suspenda suas
atividades por força de estado de greve, depois, ao retornar às suas atividades
normais, essas aulas não dadas terão que ser repostas para cumprimento da norma
legal da LDB de 200 dias letivos.
E foi nesse sentido, processo Rcl 21040 MC / SP, que o Supremo
Tribunal Federal-STF, em decisão recente (julho/2015),
ao tratar da greve dos professores do Estado de São Paulo, manifestou que é
ilegal o desconto salarial desses profissionais docentes, porque há uma
situação em que o serviço poderá ser prestado futuramente,
por meio de reposição das aulas, como costuma acontecer.
Vejamos parte da decisão do Ministro Ricardo Lewandowski: “A garantia constitucional do salário (art.
7º, inc. VII, c/c art. 39, § 3º, da CF) assegura o seu pagamento pela
Administração Pública, principalmente nas situações em que o serviço poderá ser
prestado futuramente, por meio de reposição das aulas, como sói acontecer nas
paralisações por greve de professores. De outra parte, não obstante o alegado
prejuízo aos cofres públicos em razão do pagamento de salários dos professores
nos dias parados, e em face da contratação de professores substitutos, vislumbro,
aqui também, o perigo da demora em favor dos substituídos pela ora reclamante.
É que a retenção dos salários devidos poderá comprometer a própria subsistência
física dos professores e de seus familiares” (Rcl 21040 MC / SP – 01/07/2015).
Essa necessidade de reposição das aulas cria para o movimento
de greve dos professores um diferencial em relação à greve de outras categorias,
o que pode garantir a esses profissionais da educação o direito de manutenção
do pagamento de salários mesmo no período em que estiverem parados.
O que poderia se cogitar nesse caso, é uma possível contratação
de substitutos, no período de greve, para lecionarem as aulas daqueles
profissionais que estão parados por força do movimento grevista, o que, na prática, afastaria a necessidade da reposição futura das aulas. Mas, o
problema é que sendo a greve no setor público, essa contratação não pode ser
feita a ermo ou à margem das normas de direito administrativo que estabelecem a
necessidade de um processo seletivo para a contratação. Ademais, pensamos que a contratação desses substitutos também seria uma forma coercitiva de frustrar o movimento grevista, esvaziando, mais uma vez, o direito constitucional de greve.
Espero ter
contribuído para a discussão do tema. Comentem. Obrigado.
No caso de utilização desse post, pedimos a gentileza de
respeitarem as normas legais de direitos autorais, mencionando o autor pela
seguinte referência:
RIBEIRO, Polney D.. “Greve
de professores e o desconto salarial: legal ou ilegal”. Blog Educação e Direito
- www.polneyribeiro.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário